Para evitar uma solução recortada, há conversas para buscar um consenso nos moldes do que foi feito na ADPF das Favelas
Por Flávia Maia
Os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) retomam na próxima semana um dos mais emblemáticos casos enfrentados pela Corte nos últimos tempos devido à contemporaneidade do tema — a definição da responsabilidade das plataformas sobre as postagens dos usuários e a constitucionalidade do artigo 19 do Marco Civil da Internet.
O julgamento voltará com o voto do ministro André Mendonça, que apresentará um longo e embasado voto. O ministro deve trazer sua visão sobre o tema e não vai aderir às correntes já propostas pelos relatores Dias Toffoli e Luiz Fux e por Luís Roberto Barroso, presidente do STF. Dessa forma, Mendonça deve abrir uma quarta proposta para o tema.
Também existe a hipótese do ministro Dias Toffoli fazer ajustes no voto apresentado no fim do ano passado. A posição de Toffoli sofreu críticas das big techs devido às mudanças substanciais que o relator fez no regime de responsabilidade civil das empresas quanto aos conteúdos postados. A Meta se pronunciou e disse que nenhuma “grande democracia” tem o regime de responsabilidade sugerido pelo ministro.
O presidente do STF, Luís Roberto Barroso, vai tentar emplacar o seu voto médio — mantendo o artigo 19 vigente, mas com novas responsabilidades às plataformas. No ano passado, Barroso usou de uma estratégia para trazer logo ao colegiado a sua proposta — pediu vista de uma semana dos autos para forçar o adiantamento. Pela liturgia, o voto do presidente é o último, mas como ele pediu vista, o julgamento foi retomado com o voto do ministro vistor, e ele foi o terceiro a votar.
Com tantas cartas na mesa, há o perigo de surgir uma solução “Frankenstein” para o Marco Civil da Internet a partir de alterações pontuais pegando trechos de um voto ou outro, mudando uma ou outra interpretação.
Para evitar a solução recortada, nos bastidores, há conversas para se tentar um consenso nos moldes do que foi feito na ADPF das Favelas, em que o relator, Edson Fachin, apresentou o voto e, após reuniões e almoços entre os integrantes do colegiado, chegou-se a um voto comum. Contudo, ainda não há unanimidade entre os ministros sobre essa possibilidade.
O certo é que o STF acabou se tornando a arena com solução mais “palpável” sobre a atuação das plataformas digitais no Brasil, desde que o tema travou no Congresso. Por isso, a pressão externa e interna na Corte. E a retomada se dará em meio a um mal-estar entre o Brasil e os Estados Unidos devido à discussão de possíveis sanções a ministros do STF pelos Estados Unidos sob o pretexto de que as decisões do STF ferem a liberdade de expressão — a Corte brasileira tirou do ar redes sociais como o X e Rumble por descumprimento de ordens judiciais.
Outro agente de pressão é o governo federal, que tem perdido as batalhas no ambiente virtual — vide caso PIX e INSS — e quer rápido algum critério para barrar as postagens fraudulentas. Alguns ministros do STF têm defendido publicamente algum filtro para as postagens falsas e admitem que o artigo 19 mostrou-se ineficiente. Por outro lado, as empresas estão alarmadas com as possibilidades de uma tese no STF com ares de regulamentação.
Diante de tantos cenários, um pedido de vista de algum dos ministros não vai surpreender — o que atrapalharia os planos de Barroso para julgar o tema ainda em sua presidência.