A tomada de decisões do governador em exercício Laurez Moreira ocorre sob uma dupla pressão, onde ele precisa equacionar um rombo orçamentário imediato e, ao mesmo tempo, demonstrar capacidade política e técnica em um ano que antecede a disputa sucessória. O decreto que criou o Comitê de Assuntos Governamentais, presidido pelo chefe de gabinete Ailton Parente Araújo, formaliza essa urgência administrativa. Não se trata apenas de governar, mas de “consertar o avião em pleno voo”.
Por Edson Rodrigues
Relatos da transição e diagnósticos iniciais apontaram para um quadro de difícil ajustamento. Projeções públicas registraram déficits na casa dos R$ 380 milhões quando Laurez assumiu a interinidade, um número que obrigou a administração a acionar medidas imediatas de contenção e reprogramação orçamentária. Embora a equipe de governo tenha informado à Assembleia Legislativa uma revisão dessa previsão para cerca de R$ 150 milhões após as primeiras ações, o ajuste ainda depende de uma execução rigorosa até dezembro. A lista de compromissos no curto prazo é objetiva e impositiva: quatro folhas salariais (outubro, novembro, dezembro e 13º), repasses obrigatórios a Poderes, contrapartidas de obras pactuadas com o governo federal e débitos preexistentes com fornecedores e com o instituto previdenciário. Atrasos ou falhas na gestão desses fluxos podem provocar paralisações, judicialização e um ciclo de crise que amplia o custo político da correção.
Ao lado dos números, fatores operacionais ameaçam transformar o problema fiscal em uma crise administrativa aguda. Movimentações significativas de categorias, em especial do magistério, já são uma realidade. Sindicatos cobram o envio do projeto de data-base e a regularização de progressões, e a ameaça de paralisação é concreta. Uma greve da educação teria impacto imediato na percepção pública sobre a capacidade do governo de entregar resultados. Soma-se a isso o risco de ruptura na cadeia de fornecedores que abastecem hospitais e o sistema prisional, uma vez que o acúmulo de pendências pode levar à quebra no fornecimento de alimentação e insumos. Qualquer um desses cenários pode gerar um efeito dominó, com consequências graves para a imagem da gestão.
A fragilidade do cenário estadual é agravada por choques externos. A retirada de pauta da Medida Provisória 1.303/2025 pela Câmara dos Deputados, em 8 de outubro, fechou uma janela de arrecadação extraordinária estimada em quase R$ 17 bilhões para a União. Com a caducidade do texto, o Executivo federal já sinalizou contingenciamentos e bloqueios de emendas como medidas compensatórias. Para estados como o Tocantins, isso significa menos recursos disponíveis no próximo exercício e uma necessidade ainda maior de encontrar soluções locais para o aperto fiscal.
Nesse contexto, o Comitê de Assuntos Governamentais foi concebido para centralizar decisões estratégicas e acelerar a articulação entre secretarias. A nomeação de Ailton Araújo, gestor de perfil técnico, sinaliza a intenção de concentrar decisões operacionais, reduzir o ruído político e impor disciplina orçamentária. Na prática, caberá ao comitê a tarefa de priorizar desembolsos, renegociar prazos, coordenar pagamentos, monitorar contrapartidas de obras e articular com a bancada federal. A eficácia dessas ações dependerá da autoridade política de Ailton para negociar e da capacidade da equipe em projetar fluxos de caixa realistas.
A dimensão política, contudo, é inseparável da técnica. A senadora Professora Dorinha Seabra aparece nas pesquisas como um nome competitivo para a disputa de 2026, circunstância que transforma cada resultado administrativo do período em um ativo ou passivo para a sucessão. A performance de Laurez Moreira nos próximos dois meses funcionará como um termômetro: entregar a folha em dia, preservar serviços e manter obras em andamento seriam sinais de competência; atrasos ou rupturas seriam munição para adversários. A gestão interina não governa apenas para resolver contas, mas também para não erodir sua credibilidade eleitoral.
Para que o "conserto em pleno voo" não se transforme em amadorismo, a execução exige um roteiro claro. A transparência, com a publicação de um cronograma detalhado de pagamentos, é o primeiro passo para reduzir ruídos e abrir espaço para negociações. Nesse campo, uma das principais armas da gestão será se comunicar bem, utilizando os veículos de maior credibilidade para manter a população ciente das ações governamentais e da lógica por trás de medidas inevitavelmente duras. Em paralelo, é crucial a instalação de uma mesa de negociação permanente com os sindicatos e a reavaliação estratégica de obras, mantendo apenas aquelas com contrapartida federal garantida. Tudo isso deve culminar na consolidação de um fluxo de caixa realista e em um plano de contingência para a perda de receitas federais. O risco de transformar a administração em uma máquina eleitoral antes de estabilizar o caixa é real e fragilizaria a legitimidade técnica das medidas.
Laurez Moreira assumiu com a vantagem de ter um perfil técnico e determinação reconhecida, mas vontade não substitui caixa, negociação e gestão por prioridades. O comitê presidido por Ailton Araújo é a ferramenta correta; o teste, porém, é de execução. Será preciso combinar rigor contábil com uma estratégia política fina, dialogando com sindicatos, prefeitos e a bancada federal, enquanto comunica de forma transparente cada passo dado. Se a equipe conseguir estabilizar as contas e garantir os serviços básicos até 31 de dezembro, terá não apenas o mérito técnico de evitar o colapso, mas também um capital político que poderá influenciar o processo sucessório de 2026. Caso contrário, o desgaste será intenso, e as promessas ficarão à mercê da crítica pública.
O Observatório Político de O Paralelo 13 faz questão de registrar um dado histórico: tanto o governador em exercício Laurez Moreira quanto a senadora Professora Dorinha nunca perderam uma eleição. Esse retrospecto torna as eleições estaduais de 2026 um ponto de inflexão — o teste que poderá quebrar o tabu entre os dois líderes políticos mais consistentes do Tocantins na última década. Vida que segue...