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Como funcionava esquema de fraudes que vendia vagas em concursos por até R$ 500 mil

Posted On Quarta, 08 Outubro 2025 14:02
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Organização criminosa familiar usava dublês, dispositivos eletrônicos e até cirurgias para burlar provas da PF, Caixa e CNU

 

 

Por Marina Verenicz

 

 

Uma operação da Polícia Federal (PF) revelou um esquema de fraudes em concursos públicos que funcionava como uma empresa familiar, com sede em Patos (PB), e cobrava até R$ 500 mil por vaga.

 

O grupo usava tecnologia de ponta para burlar sistemas de segurança, incluindo dublês, pontos eletrônicos implantados cirurgicamente e comunicação em tempo real com candidatos.

 

A Operação Última Fase, deflagrada na última quinta-feira (2), cumpriu mandados de prisão e busca e apreensão em quatro estados. Segundo a PF, o esquema operava há mais de dez anos e envolvia corrupção de fiscais, falsificação de documentos e lavagem de dinheiro por meio de imóveis, veículos e até clínicas odontológicas.

 

O líder e a estrutura familiar

O grupo era liderado por Wanderlan Limeira de Sousa, ex-policial militar expulso da corporação em 2021. Apontado como o articulador central da quadrilha, ele negociava com candidatos, coordenava a logística das provas e distribuía os gabaritos.

 

Ao lado dele, atuavam irmãos, sobrinhos e cunhados, cada um com funções específicas, que iam desde o recrutamento de interessados até o repasse de respostas.

 

Entre eles, a sobrinha Larissa de Oliveira Neves, que chegou a ser aprovada no Concurso Nacional Unificado (CNU) e era usada como “vitrine” para atrair novos clientes.

 

Segundo a PF, Wanderlan chegou a se inscrever no CNU de 2024 apenas para provar a eficácia do método, tendo sido aprovado para o cargo de auditor fiscal do trabalho, com salário inicial de R$ 22,9 mil. Após o resultado, não compareceu ao curso de formação.

 

Fraudes e pagamentos

As investigações apontam que os pagamentos variavam conforme o cargo e a dificuldade da prova. Além de dinheiro vivo, o grupo aceitava propina em ouro, veículos e até procedimentos odontológicos.

Entre os suspeitos estão Ariosvaldo Lucena de Sousa Júnior, policial militar e dono de uma clínica usada para lavagem de dinheiro, e Thyago José de Andrade, responsável por controlar os repasses e emprestar recursos para cobrir subornos.

 

A advogada Laís Giselly Nunes de Araújo, de Recife, também figura entre as investigadas. Ela teria fraudado ao menos 14 concursos, incluindo o do Tribunal de Contas de Pernambuco (TCE-PE), cujo resultado foi suspenso.

 

Fraudes no CNU

A PF reuniu provas técnicas contundentes, entre elas gabaritos idênticos de quatro candidatos, entre eles Wanderlan, seus familiares e cúmplices. O laudo pericial da Cesgranrio concluiu que a chance de coincidência casual é equivalente a ganhar a Mega-Sena 18 vezes seguidas.

 

As fraudes também atingiram concursos da Polícia Federal, Caixa Econômica Federal, Polícias Civil e Militar, UFPB, Banco do Brasil e o próprio CNU.

Em conversas interceptadas, Wanderlan e o filho Wanderson Gabriel discutiam estratégias para aplicar o golpe no CNU, adiado em maio devido às enchentes no Rio Grande do Sul.

 

“A nossa comissão vai ser lá no CNU. Vou batalhar pra nós, ver se nós consegue na poiva (dinheiro)”, dizia Wanderlan em áudio gravado em 4 de junho de 2024.

 

Lavagem de dinheiro e prisões

A PF identificou movimentações financeiras incompatíveis com a renda dos investigados. Relatórios do Coaf mostraram que Geórgia de Oliveira Neves, cunhada do líder, depositou R$ 419 mil em espécie, mesmo sem vínculo formal de trabalho desde 1998.

 

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Parte dos pagamentos era disfarçada em transações imobiliárias e de veículos, com uso de laranjas e contratos fictícios. Em um dos casos, uma motocicleta foi usada como forma de pagamento de propina em um concurso da Caixa.

 

Até o momento, três pessoas foram presas preventivamente — duas em Recife e uma em Patos. Os principais investigados ainda não haviam tomado posse em cargos públicos.

 

Próximos passos

A PF e o Ministério Público Federal (MPF) seguem rastreando os fluxos financeiros e possíveis envolvimentos de servidores públicos. O juiz Manuel Maia de Vasconcelos Neto, da Justiça Federal da Paraíba, afirmou em decisão que a quadrilha “atuava com divisão de tarefas e cobrava cerca de R$ 300 mil por vaga”.

 

Até o momento, não há indícios de participação direta das bancas organizadoras, mas as autoridades investigam vínculos de intermediários e profissionais da saúde no suporte logístico ao esquema.

 

As defesas dos investigados negam as acusações e afirmam que não há provas que liguem os suspeitos às fraudes apontadas.

 

 

 

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